PREFÁCIO: Poétic@, aventura e corrosão
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EPITÁFIO
Confissão A morte do poetaPÓS-ESCRITO
Versos perdidos da página 54 Esclarecimento Vende-se livro de poemas
Poética, aventura e corrosão
Poétic@, aventura e corrosão
Às vezes, no meio do caminho da nossa vida (esse mesmo que citava Dante) aparecem mudanças ás que lhes presentimos um gigantesco ónus de profundidade. O aparecimento da sociedade digital e da Internet é uma dessas mudanças. A sua pujanza pode-nos criar perplexidade, entusiasmo ou rejeição, mas que condiciona ineludivelmente o tempo em que vivemos. Eu sinto-me afortunado por poder assistir ao começo de uma dessas mudanças. Nela, não vejo mais que reptos apaixonantes. Quisermos ou não, o futuro do livro está determinado pelos novos paradigmas digitais. Portanto, como tenho manifestado noutras ocasiões, é preferível assumir e inclusive protagonizar as mudanças antes de que elas te arrastem e só saibas agarrar-te à última carruagem para sobreviver. Não estou com nenhuma dúvida de que a nova sociedade digital vai condicionar os processos criativos em todos os âmbitos da arte, mas muito singularmente no relacionado com a escrita e com a leitura. Por consequência, Poétic@ é a minha pessoal aposta literária neste processo. Viajam comigo muitas dúvidas, imperfeições, incoerências, dificuldades e desconhecimentos mas, em todo o caso, ai vai. Eu (também) navegar.
Quanto ao seu processo criativo Poétic@ é um livro de comprido percurso. Para muitos escritores e escritoras, o tempo é fundamental. Às vezes, porque a escrita é uma carreira cronometrada para evitar a dissolução que o próprio tempo exerce sobre a criação literária. E também porque marca uma linha evolutiva. Na criação literária, o tempo marca etapas. Mas os tempos, na criação literária, também são em alto grau enganosos. Porque há obras que respondem a impulsos diversos em momentos diversos. Se calhar, com Poetic@ acontece algo disso. Em realidade, o poemário foi escrito durante os anos 2008, 2009 e 2010. Tinha a vocação de provocar a reflexão e o debate, sem preconceitos, desde uma perspectiva meta literária, em torno da poesia, com uma mirada irónica, flexível, desmistificada, lúdica e corrosiva. E fazia-o desde uma estrutura que se alimentava de múltiplas fontes e se inspirava iniludivelmente em Internet. Era, naqueles anos, um poemário pensado em função da rede –a sua estrutura é exactamente a mesma que conserva hoje– mas com o intuito de ser publicado em papel. Mesmo ainda que daquela já oferecesse no papel múltiplas ligações à rede.
(Galego) #
Não é que naquele momento eu não quisesse apostar por uma edição digital –que nunca deixei de tê-lo em mente–, senão que não via possibilidades técnicas ao meu alcance para fazê-lo. A maiores, quando rematei Poétic@, tinha outro poemário rematado. Era Transición, com uma escrita ligada a uma etapa anterior (ainda que com algum piscar de olhos a este poemário). E devido a essas manias que temos os criadores de marcar terreno com a mijada, como fazem os cães –quer dizer, de deixar patente uma linha evolutiva–, decidi que Poétic@ devia sair depois de Transición. Até que esse poemário se publicou, a finais de 2011, voltei constantemente sobre Poétic@, num processo de reescrita permantente, coma se fosse um desafio ao tempo.
Concebido graças e em função da rede, contudo, o livro –já o disse– estava destinado ao papel. A essa concepção responde o poema «O meu hipertexto afogou no papel», que agora poderia parecer obsoleto mas que pode ler-se como um espelho das inquietações de uma geração consciente de que está a testemunhar a alvorada de um processo histórico de mudança no paradigma do livro que vai afectar –e muito– ao processo criativo do futuro. Também havia no livro um contraditório e irónico jogo de enlaces (impossíveis?) entre o ecrã e o papel. Com efeito, Poétic@ (com esse mesmo título desde o começo), nasceu inicialmente pensado para o papel, mas em cada nova leitura ia adquirindo na minha cabeça um aspeto tangível que me levou a apostar edição digital. Naquele momento, o poemário nu, sem recursos mas com a mesma estrutura e concepção, centrava toda a sua força no inusitado dos seus conteúdos, inter-relacionados, e nesse sarcasmo corrosivo que o define.
O facto de que cada vez fosse quem de visualizá-lo mais e mais digital, levou-me a o oferecer a uma editora que apostava por essa via e que, para a minha fortuna, o acolheu com agrado. Seja como for, tudo estava por explorar, mesmo para a editora, porque –que eu saiba– praticamente nada se publicara –quando menos no âmbito da nossa cultura– desta condição. Esse facto do inexplorado ofereceu-me tempo suficiente de pensar e repensar o poemário, voltando sobre ele de maneira infatigável –e mesmo esgotadora– ao longo dos últimos anos.
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Até que chegou um momento em que me convenci a mim mesmo de que um projecto destas características tinha que estar totalmente pilotado e controlado por mim. Eu tinha que poder trabalhar, modificar e actualizar o poemário em qualquer momento, muito especialmente sabendo que se tratava de uma experiência pioneira, quando menos desde o ponto de vista pessoal. Em consequência, falei com a pessoa que ia ser o meu editor –à que devo agradecer-lhe a sua compreensão–, a quem lhe expus a a necessidade que eu via de apostar na editoração eletrônica. Por outra parte, para qualquer editora este projecto significava uns custeios de produção altos e dificilmente amortizáveis. É o problema de um modelo de edição não definido no seu processo de exploração comercial.
Portanto, decidi editorar eu mesmo o livro, como fizera com o meu primeiro poemário (Persianas, pedramol e outros nervios, 1992). Isso sim, agora tinha diante de mim necessidades bem diferentes. Porque, enquanto este tipo de processos de edição não se popularizem para facilitar o uso quotidiano, os criadores e criadoras temos que ter algo de tecnologista. E, além disso, devemos deitar mão de pessoas que saibam programar e desenhar. E aqui chegado, devo agradecer-lhe a Kris Darias e ao seu Estudi Llimona o seu trabalho e a sua aposta por este projecto.
Agora, Poétic@ é inevitavelmente digital e devo confessar que a busca e associação de recursos –embora laboriosa– foi um trabalho tão criativo e gratificante como o próprio processo de escritura, que fui renovando e atualizando dia a dia num processo infatigável. Nesse sentido, é um livro inovador. E, ademais, um livro vivo, cambiante, que posso atualizar quando a oportunidade mo dite. Mas também devo confessar que a edição digital me obrigou a mudar a forma de conceber o texto, modificando-o e fazéndo-o mais flexível.
Por exemplo, uma das características da versão anterior de Poétic@ é que muitos poemas careciam de título. A necessidade de habilitar uma url diferenciada para cada poema obrigou-me a titular todos e cada um dos poemas.
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Também o processo de maquetização site me fixo mudar a aparência ou a disposição de muitos versos , de alguns dos slogans ou das múltiplas citações que, dialogando no texto, circulam pelas suas páginas, assim como buscar opções de retorno nas ligações de navegação. E, por suposto, a agudizar até o limite os contrates e acoplamentos entre os diferentes discursos textuais, de áudio, de vídeo e de qualquer outro tipo de fontes de procedência multimédia. Porque, em realidade, muitos elementos propriamente transmídia podem modificar profundamente o sentido do texto, que adquire novos significados. A dizer verdade, estou assombrado ao comprovar até que ponto este último ano –no que trabalhei quase exclusivamente on-line– condicionou a minha escrita, a minha visão do poemário e a minha forma de conceber o texto.
Enfim, pude sentir na minha própria pele que, para bem ou para mal, criar desde o âmbito digital introduz modos e condicionantes diferentes à hora de encarar a criação. E foi todo um prazer.
Agradecimentos (e desculpas)
A Helena González, boa amiga que sempre está ai, ao outro lado do fio telefónico; a María Beatriz Eiroa, que reviu com muita paciência a minha tradução de Poétic@ ao castelhano; a Fátima Isabel Figueiras Ramos, pela sua atenta revisão da tradução ao português, a Ramón Nicolás, pela sua ajuda generosa; a Manuel G. Vicente, autor da fotografia da portada; a Gabbi, que me prestou a sua voz americana; a Xela, que me substituiu com a sua voz no poema «Sortes»; a Lara Bacelo, pelo fragmento da vídeo criação Ollos da cidade; e muito especialmente a Kris Darias e o Estudi Llimona, desenho e suporte técnico de Poétic@. Vá também o meu agradecimento para as pessoas que participaram nas gravações que, ainda procedendo de outros livros, fazem parte de Poétic@, com as vozes de María Lado, de Alma, a música de Xurxo Souto e o apoio do estudo de gravação Casa de Tolos.
Também aproveito para pedir desculpas pela publicidade que aparece nos vídeos enlaçados de Youtube, publicidade que é alheia completamente à minha vontade e que é responsabilidade da companhia que aloja os vídeos.
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Everything we write
will be used against us
or against those we love.
ADRIENNE RICH
Sovint, quan rellegeixo els meus poemes,
penso que, ben mirat, allò que he escrit
no ha pas modificat el ritme de les coses.
MIQUEL MARTÍ I POL
Os poetas, numa enorme fila que ultrapassa já a esquina
do quarteirão seguinte, aproveitam o momento de espera
para preencherem cuidadosamente o formulário.
GONÇALO M. TAVARES M.
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Druída, sacerdote, máxico poeta
artífice único da cerimonia
MARÍA XOSÉ QUEIZÁN
baldeiro os artistas esgotaron os signos
enchen cadros de negro e vermello
liñas que non levan a ningures
espazos pechados coma o lenzo
lenzos que non son lenzos
madeiras papeis ferros
MIGUEL VÁZQUEZ FREIRE